quinta-feira, 27 de setembro de 2007

Ill ne comprennent pas


Quantas vezes nós reclamamos de pessoas? Quantas vezes as pessoas parecem fazer tudo errado ao nosso redor? O mundo está uma calamidade, a política se afunda cada vez mais. E nós sempre reclamando de todos que não pensam como a gente. Aquele amigo que não concorda com o nome do seu time, o guitarrista da sua banda que quer ter o volume mais alto que todos no mundo, o cantor incompreendido que na verdade não sabe cantar, a secretária atrapalhada que parece não fazer nada direito. Todas as pessoas que nos enchem o saco, nossos chefes, diretores, professores, que parecem não se importar e não dar a mínima para o que estamos pensando.
Jogamos toda a nossa fúria nessas pessoas, tudo aquilo que nos irrita, e falamos mal, chingamos, e dizemos que elas não pertencem ao rol dos que vão para o céu, entre muitas outras coisas dignas de um festival de Cannes para chingamentos. A raiva é tão grande que só pensamos no fato dessas pessoas nos fazerem infelizes e perturbarem até o último átomo de nossas almas. Cada segundo que se passa ao lado dessa pessoa é perturbador, ridículo e atordoante. Como conseguir perdoar coisas imperdoáveis? Há alguém que explique isso? Há possível perdão para os políticos, ladrões, patrões, prostitutas, promíscuos, argentinos, palmeirenses, bateristas, guitarristas, pianistas, baixistas, universitários, seminaristas, líderes compulsivos, cantores de chuveiro, viciados em coca-cola, escritores que ficam enrolando nos exemplos e aproveitadores e todo tipo de gentalha que perturbam os pobres inocentes?
A questão é que todos perturbamos todo mundo. Eu sou com certeza o pior pesadelo de alguém, só não sei ainda. Por mais que sejamos e procuremos ser legais, alguém sempre achará ruim. Coloque-se no lado de quem supostamente te faz o mal. É assim que o perdão começa, aceitando o outro, seu inimigo. A vida pode começar a ficar mais sossegada depois disso, garanto que tira um stress danado! O ato de se jogar fora o rancor e dar espaço para o perdão renova o nosso ser, pois nos faz mais parecidos com Deus.
Houve um homem na história, que ainda vive hoje, que passou por uma gigantesca prova de perdão, e venceu. Primeiro, foi traído por um dos seus mais próximos amigos. Depois, foi entregue pelo traidor nas mãos de guardas romanos, e condenado a ter a pior morte da época, morte de Cruz. Ainda senão bastasse foi torturado, e além do que devia, chicoteado, chincado, e a multidão, que aparentemente antes mostrava respeito e até o seguia, acabou se voltando contra ele, preferindo libertar um ladrão chamado Barrabás do que ele. Aos olhos de Jesus, cheio de espasmos da agonia da morte, espancado, intimado, humilhado, flagelado e cuspido, vemos a multidão observando sua dolorosa morte entre dois ladrões. E a única coisa que sua boca ainda consegue pronunciar, uma de suas últimas palavras, saindo de um corpo debilitado pelos pecados de toda humanidade é: Ils ne comprennent pas
Eles não entendem
O Cristo crucificado e torturado em suas últimas nos perdoa por tudo o que o fizemos. Ao invés de nos repudiar, ao invés de guardar rancor, e de tantas outras coisas que fazemos hoje em dia a quem nos faz mal, Ele diz: "Pai, perdoa-lhes, pois não sabem o que fazem. Eles não entendem." Ele olhou com compaixão a humanidade caída e avarenta, não esqueceu um segundo sequer de quem era e para que veio morrer naquela cruz. Seu amor por nós o manteve firme, e o ressuscitou, nos salvou e pode transformar nossas vidas a serem mais parecidas com a dEle. Quando reviramos o nosso coração para transformarmos toda a nossa raiva, angústia e repressão em apenas perdão e amor transcendemos a linha da vida e nos tornamos mais parecidos com aquele que morreu por nós, Jesus Cristo. Esse fato, de Jesus ter nos perdoado, é forte demais, ousado demais, gritante e extravagante ao ponto de nos direcionar a fazer a mesma coisa. O desafio do perdão é esse, procurar entender que as pessoas podem não entender realmente o sentido das coisas, podem não conhecer de fato o que conhecemos, e não ter as mesmas opiniões que temos. "Elas não entendem", assim como também nós podemos não entender e machucar também aos outros consequentemente. Assim, retomo à frase que tem nos últimos dias transformado todo o meu ressentimento em compaixão: Ils ne comprennent pas.

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